segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Policial Militar e Bombeiro Militar não responde por Deserção



Por Rafael Pereira de Albuquerque
O Superior Tribunal Militar patenteou pacífica orientação de que o crime de Deserção é de mão própria e tem como agente o militar da ativa. Com efeito, o art. 4°, inciso II do Estatuto dos Militares estabelece que a Polícia Militar e Corpo de Bombeiro Militar são reservas das Forças Armadas:
Art. 4º São considerados reserva das Forças Armadas:
I - individualmente:
a) os militares da reserva remunerada; e
“b) os demais cidadãos em condições de convocação ou de mobilização para a ativa”.
“II - no seu conjunto:
a) as Polícias Militares; e
b) os Corpos de Bombeiros Militares.”
Além disso, o art. 3°, par. 1°, alínea “a”, inciso III, esclarece que os componentes da reserva podem vir a integrar o quadro “da ativa” em ocasiões especiais:
Art. 3º Os membros das Forças Armadas, em razão de sua destinação constitucional, formam uma categoria especial de servidores da Pátria e são denominados militares.
§ 1º Os militares encontram-se em uma das seguintes situações:
a) na ativa:
I - os de carreira;
II - os incorporados às Forças Armadas para prestação de serviço militar inicial, durante os prazos previstos na legislação que trata do serviço militar, ou durante as prorrogações daqueles prazos;
“III - os componentes da reserva das Forças Armadas quando convocados, reincluídos, designados ou mobilizados;”
IV - os alunos de órgão de formação de militares da ativa e da reserva; e
V - em tempo de guerra, todo cidadão brasileiro mobilizado para o serviço ativo nas Forças Armadas.
b) na inatividade:
I - os da reserva remunerada, quando pertençam à reserva das Forças Armadas e percebam remuneração da União, porém sujeitos, ainda, à prestação de serviço na ativa, mediante convocação ou mobilização; e
II - os reformados, quando, tendo passado por uma das situações anteriores estejam dispensados, definitivamente, da prestação de serviço na ativa, mas continuem a perceber remuneração da União.
III - os da reserva remunerada, e, excepcionalmente, os reformados, executado tarefa por tempo certo, segundo regulamentação para cada Força Armada. (Alterado pela L-009.442-1997)
Do exposto, tem-se:
1. Sujeito passível de “convocação”: Os reservistas, militares estaduais e integrantes da reserva remunerada.
2. Sujeito passível de “reinclusão”: Os integrantes da reserva remunerada, isto é, quando percebam remuneração da União.
3. Sujeito passível de “designação”: Os reformados das Forças Armadas e da reserva.
4. Sujeito passível de “mobilização”: Os militares estaduais, reservistas, integrantes da reserva remunerada e, em estado de guerra, o civil.
Em suma, tanto os militares estaduais quanto os reservistas, são “militares em potencial”, ao passo em que se sujeitam às situações acima previstas, para integrar temporariamente o quadro da ativa da Forças Armadas, como componentes das Forças Auxiliares.
São “cidadãos em condição de convocação ou mobilização” a que se refere o art. 4°, inciso I, alínea “b” acima consignado.
O militar estadual em condição ordinária de Servidor Público Militar Estadual, não é militar em sua concepção original, até porque não se ajusta a quaisquer das situações previstas no art. 3°, par. 1°, alínea “a”, especificamente quanto à situação de atividade.
Também não se pode amoldar o militar estadual no conceito de “militar da inatividade”, nos termos de que trata a alínea “b” deste artigo, já que se limita aos componentes da reserva remunerada “que percebem remuneração da União”. Definitivamente, não é o caso do agente de policia ou bombeiro militar.
Portanto, como o militar estadual não se encontra naquelas situações previstas como sendo da ativa ou inatividade, não é considerado militar “membro das Forças Armadas”. Na verdade, a condição do militar estadual em relação às Forças Armadas é semelhante a do reservista. São “militares pro-tempore”.
Em relação ao Código Penal Militar, ele não se afeiçoa à expressão “militar em situação de atividade”, pois esta denominação se confunde com o termo “militar da ativa”:
Art. 6º São equivalentes as expressões "na ativa", "da ativa", "em serviço ativo", "em serviço na ativa", "em serviço", "em atividade" ou "em atividade militar", conferidas aos militares no desempenho de cargo, comissão, encargo, incumbência ou missão, serviço ou atividade militar ou considerada de natureza militar nas organizações militares das Forças Armadas (...) Estatuto dos Militares.
Nem tampouco se pode afirmar que o serviço policial militar, patrulhamento ostensivo e prevenção da ordem pública, seja atividade de “natureza militar”; do contrário não lograria o seguinte dispositivo do art. 9°, inciso III, do Código Penal Militar:
d) ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, “ou” no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquele fim, ou em obediência a determinação legal superior.
No texto acima, a conjunção “ou” caracteriza a distinção entre “função de natureza militar” e “serviço de garantia e preservação da ordem pública”.
Não há também falar em “máculas” à Administração Militar, haja vista que o serviço policial militar vincula-se à Administração Pública. Destarte, no caso em exame não incide o seguinte dispositivo do CPM:
Equiparação a militar da ativa
Art. 12. O militar da reserva ou reformado, empregado na administração militar, equipara-se ao militar em situação de atividade, para o efeito da aplicação da lei penal militar.
O termo “empregado na administração militar” se restringe às situações peculiares em que o servidor militar estadual (reserva de Exército) é mobilizado, convocado ou designado, hipótese em que, conforme já descrito, ele se equipara ao militar da ativa. É justamente quando “deixa de ser militar em potencial” para se tornar “militar ao pé da letra”.
Todavia, fora dessa especialíssima eventualidade, o policial e bombeiro militar estadual, bem como os reservistas não são militares, mas sim “cidadãos sujeitos à disciplina militar”, ou seja, pessoas passíveis de torna-se “militares provisórios”.
Segundo a técnica hermenêutica, o crime de Deserção, por ter como objetividade jurídica a Administração Militar, e não a Administração Pública, não pode nem deve ser imputado aos militares estaduais, salvo em caso de mobilização, designação ou convocação.
As instituições militares estaduais, embora reservas das Forças Armadas, desempenham serviços destinados à manutenção da ordem pública e a proteção da incolumidade física e moral das pessoas. Todavia, em situações especificamente definidas em lei e que ensejam convocação, mobilização ou designação dos seus componentes, tais atividades se nivelam às essencialmente ou de natureza militar.
Conclui-se que o militar estadual só é considerado “militar” às luzes da legislação estadual pertinente, visto que se sujeitam à hierarquia e disciplina, inspiradas no regulamento do Exército. Mas, realizam atividades civis, sendo que em regra, são assim concebidos pela lei penal.”

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